Um paciente chamado Brasil - Resenha crítica - Luís Henrique Mandetta
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Um paciente chamado Brasil - resenha crítica

Um paciente chamado Brasil Resenha crítica Inicie seu teste gratuito
Biografias & Memórias

Este microbook é uma resenha crítica da obra: 

Disponível para: Leitura online, leitura nos nossos aplicativos móveis para iPhone/Android e envio em PDF/EPUB/MOBI para o Amazon Kindle.

ISBN: 978-85-4700-114-8

Editora: Objetiva

Resenha crítica

Pela vida, desde o começo

Luís Henrique Mandetta define sua trajetória como uma permanente luta contra a morte e em sintonia com a vida. Ele é o quinto filho de um pai médico, inteiramente dedicado à profissão, e de uma mãe forte, que guiou seus passos e formação desde os primeiros anos de vida.

O patriarca dos Mandetta permitia permanentes visitas dos filhos a salas de médicos. Por isso, desde cedo o cheiro de éter parecia um perfume para o autor. Era comum receberem a visita de pacientes na casa em que foi criado. Sua vocação estava ali, definida desde os primeiros anos de vida.

Do pai, herdou um mantra: médico não abandona pacientes. Se ele não pode ser curado, deve ter o sofrimento controlado. Mandetta dedicou-se à ortopedia pediátrica no começo da carreira porque sempre sentiu incômodo ao ver crianças sem poder brincar, andar e se divertir com liberdade, explorando o mundo. 

Com o passar do tempo, os desafios aumentaram. Presidiu a cooperativa de trabalhadores médicos de seu estado, fez uma pós-graduação na Fundação Getúlio Vargas em gestão de sistemas de saúde privados e na sequência assumiu a Secretaria Municipal de Saúde de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, por cinco anos. Ali, percebeu que é possível atuar na saúde em uma escala mais ampla por meio de políticas públicas. 

Em 2010 e 2014, foi eleito deputado federal pelo partido Democratas. Em seus oito anos de presença assídua na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara, durante o auge do poder do PT e seu declínio, observou muito o comportamento da classe política, da sociedade e da imprensa. 

Na Câmara, conheceu o deputado Jair Bolsonaro. Na eleição presidencial de 2018, Mandetta não se candidatou e acreditava que voltaria a atuar na medicina no Rio de Janeiro, terra de sua esposa e do primeiro neto. Mas aceitou o convite de estar à frente do Ministério da Saúde. 

Prevendo a catástrofe

Quando as primeiras notícias sobre a gravidade da pandemia do novo coronavírus começaram a ser analisadas pelo Ministério da Saúde, Mandetta começou a ter problemas com o chefe. 

O presidente era difícil de ser moderado e dava mais ouvidos a teorias da conspiração do que a seu ministro de Estado. Ele acreditava que o vírus fazia parte de um plano da China para derrubar os governos de direita da América Latina. A cada passo dado, eram levados em consideração cálculos eleitoreiros, gerando conflitos entre a pasta comandada pelo autor e o Palácio do Planalto. 

No começo da crise, o Ministério da Saúde estimava até 180 mil mortes, caso não fossem adotadas medidas para frear o contágio da covid-19. Militares do primeiro escalão do governo ficaram assustados, mas não mudaram a conduta do presidente. 

Segundo Mandetta, foram várias as vezes em que tentou apresentar os possíveis cenários ao presidente, que optava por sempre deixar para depois. Bolsonaro nunca aceitou sentar ao lado de seu ministro para ver, interpretar e analisar a realidade catastrófica que estava por vir. 

Mandetta chegou a apresentar os números de suas projeções ao general Braga Netto, então Ministro da Casa Civil, e a Sérgio Moro, na época Ministro da Justiça. De nada adiantou. 

Quando o número de mortes na Itália chocava o mundo, com corpos sendo carregados por carros do Exército local, o ministro perguntou ao presidente se ele aguentaria ver aquelas cenas repetidas no Brasil. A resposta cortante deixava claro o desastre na gestão da pandemia. Sim, Bolsonaro aguentaria ver aquela tragédia em seu país. 

Fritura pública

Mandetta tentou exaustivamente fazer com que Bolsonaro mudasse sua interpretação sobre a gravidade da pandemia. Para isso, usou até mesmo a imprensa como forma de pressioná-lo, mas as teorias conspiratórias e o negacionismo eram prioridade. 

A cura por meio da cloroquina foi a solução quase mágica, adotada pelo Planalto, para incentivar a população a quebrar o isolamento social em prol da economia, claramente visando a ter menos prejuízos na futura disputa presidencial. Quando o ministro se recusou a adotar o medicamento como recomendação oficial do Governo, a relação ficou insustentável. 

As alfinetadas públicas foram o começo da fritura de Mandetta. Bolsonaro adotou o discurso de que não é possível cuidar da saúde sem tratar da economia, uma dicotomia inexistente. Dentro do governo, o entorno do presidente tratava Mandetta como opositor. 

Uma das ocasiões em que o desgaste ficou nítido foi quando o então assessor especial da presidência, Arthur Weintraub, chegou a bater uma porta na cara do ministro da Saúde, impedindo sua entrada em uma reunião. Houve um dia em que Bolsonaro visitou a padaria que Mandetta frequentava, provocando aglomeração, como sinal de que sabia os passos dados pelo ministro. Ali, sentiu medo de usarem imagens das câmeras de vigilância para desmoralizá-lo. 

Claramente, seus dias no governo estavam contados. E o estopim foi uma entrevista concedida à Rede Globo, em que criticava o presidente publicamente ao falar sobre o descompasso entre seu ministério e o Planalto. 

O cerco se fechando

Passamos da metade deste microbook sobre a tragédia brasileira. No tratamento diário entre os ministros, Mandetta relata um Paulo Guedes que fazia o possível para se autoelogiar nas reuniões do governo, enquanto o suposto dilema entre Saúde e Economia era disseminado na opinião pública. 

Os dois nunca chegaram a conversar para trocar informações referentes à pandemia e planejar ações conjuntas. Guedes estava desinteressado nos efeitos drásticos que o coronavírus causaria. 

Houve um bate-boca entre os ministros quando Mandetta defendia o adiamento da autorização para o reajuste de medicamentos. Sem saber como o valor dos remédios é tabelado no Brasil, o Ministro da Economia falava em não admitir o tabelamento. O vice-presidente Hamilton Mourão precisou intervir, já que o tom de voz deles estava acima do normal. 

Nas reuniões ministeriais, Bolsonaro sempre dedicava grande espaço a tratar do chamado inimigo da semana. Nos tempos de pandemia, o ministro da Saúde ocupou este lugar na mente errática do atual presidente. A necessidade de preservar mais vidas fez com que Mandetta não pedisse para sair do governo antes. 

Mas a fritura continuava e nem mesmo os vazamentos que o ex-ministro admite ter feito para a imprensa, buscando alterar os rumos tomados por Bolsonaro, foram o suficiente para ele entender a gravidade da situação em que o país ia se metendo dia após dia.

Traições e interferências

Com o passar do tempo, criou-se um movimento interno para a exoneração de Mandetta do cargo. Tornou-se público um diálogo constrangedor entre Onyx Lorenzoni e Osmar Terra, notório negacionista da pandemia, tramando para conseguir o cargo. 

No livro, o ex-ministro sugere uma suposta traição de Lorenzoni. Em 2016, no auge da Lava Jato, o então deputado gravou uma reunião entre colegas do DEM em que foram discutidas medidas de combate à corrupção propostas por procuradores de Curitiba. 

Ao revelar a Mandetta que poderia vazar o conteúdo discutido, acabou isolado e só voltou à notoriedade após a eleição de Bolsonaro. O próprio Onyx trabalhou para que Mandetta fosse convidado a ocupar o Ministério da Saúde. O fogo amigo foi crucial para ele ser, enfim, colocado para fora da administração federal. 

Concessões e protagonismo

Mandetta não se exime de expor críticas ao Governo Federal durante a condução da crise pandêmica em seu tempo como ministro. E revela a existência de concessões para tentar acalmar os ânimos. Uma delas foi quando voltou atrás da suspensão de cruzeiros marítimos após um forte lobby de setores do Turismo. 

Em outro momento, orientou os militares a despistar a imprensa quando um integrante da comitiva de repatriação dos brasileiros que estavam em Wuhan apresentou sintomas de covid-19. 

Por mais que admita ter cometido erros na condução do ministério, Mandetta volta suas críticas fortes a quem se comportou desrespeitando a ciência desde o começo da pandemia que já completou mais de um ano: o governo de Jair Bolsonaro. 

A leitura deste livro explica bem porque, a cada dia que passa, fica mais difícil vislumbrar um futuro de vacinação em massa e imunização da população brasileira, já que a condução do país é feita por governantes descompromissados com as vidas em jogo, perdidas aos milhares, dia após dia.

Notas finais 

Em mais de um ano enfrentando a pandemia de covid-19 pelo Brasil, nos deparamos com uma série de atitudes contraproducentes na contenção da doença. Neste relato íntimo de Mandetta, fica claro o quanto o respeito à ciência não foi prioridade do governo federal desde os primeiros dias em que o novo coronavírus desembarcou no Brasil. Este livro é um documento histórico para as próximas gerações nos cobrarem sobre como fomos capazes de chegar a este momento caótico, distópico e apavorante. 

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Quem escreveu o livro?

Luiz Henrique Mandetta (Campo Grande, 30 de novembro de 1964) é um médico ortopedista e político brasileiro. Foi deputado federal por Mato Grosso do Sul entre 2011 e 2019 e Ministro da Saúde no governo de Jair Bolsonaro,... (Leia mais)

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